Nevaska havia soprado seu vento gelado pela vasta tundra e este havia alcançado o reino de Rivergate. O rio estava congelado há três dias e Tathagata gostou da surpresa pois agora poderíamos atravessar por cima dele, isso acabou economizando uns dias de viagem. Minha mãe acrescentou “o bom augúrio nunca é trazido pelo frio” e ela estava certa.
Eu e os irmãos Elafir e Ender estávamos escondidos atrás de um rochedo que desde o início do inverno estava coberto de musgo vestido do branco da neve. Um calor agradável emanava de Elafir afastando o frio intenso e as sombras de Ender cobriram nossos vestígios do mundo. Estávamos invisíveis. O grupo decidiu isso, apesar do meu protesto. Minha mãe e o tio Tathagata eram os únicos que confrontavam o inimigo adiante.
Era um necromante, do tipo que a gente encontra no meio do caminho se vangloriando de seu poder e então morre. Seu nome era Vrothgarr. Alguma coisa estava agarrando Tathagata, Ender me disse que eram dois espectros de gelo e estavam quase invisíveis (“nublados” foi o termo que ele usou). Eu gosto do tio Tathagata, do jeito dele. Eu sei que mamãe gosta também, apesar das muitas críticas, ela diz: “todos os monges que conheci são sábios, exceto Tathagata”. Elafir sussurrava “não adianta usar a força seu imbecil, eles são espectros!”, parecia em agonia, dava pra sacar que o tio não sabia como enfrentar aquele inimigo. Tathagata tinha uma estratégia quando isso acontecia que era apanhar e sobreviver até que os demais aliados vencessem seus respectivos inimigos para então vir ajudá-lo. Ender disse que, para aquela situação, essa estratégia era até aceitável, porque os espectros de gelo iriam desaparecer quando mamãe eliminasse Vrothgarr.
Mamãe sempre foi cheia de regras, muitas delas impostas por ela mesma. Dizia que se não pudesse enfrentar páreo a páreo um necromante convencido daqueles, não merecia os poderes que a deusa Phoebe lhe impunha. O tio me contou que ela começou com esses desafios depois de fracassar numa missão importante e agora o fracasso era seu maior medo, apesar de afirmarem que paladinos não têm medo algum.
Um cone de frio partiu das mãos pálidas do necromante enquanto ele gargalhava histericamente – esse tipo de inimigo ensandecido está cada vez mais comum no mundo – mamãe dissipou o frio com o calor que irradiava de seu martelo de guerra, depois golpeou o chão de gelo e fez o necromante cair humilhado. Ela disse “arrependa-se pecador e a deusa Phoebe te queimará com fogo misericordioso, caso contrário, morrerá dolorosamente” e, apesar de não gritar a ameaça, seu tom tinha sido suficiente. Me surpreendi quando Vrothgarr respondeu “vá à merda, sua vaca parida! No reino de meu senhor Saulot não existe a morte!”, daí gritou de forma agonizante quando o martelo de mamãe lhe quebrou as costelas, depois o fogo divino o consumiu até as bolotas dos olhos.
Saímos do esconderijo depois que os espectros de gelo explodiram em estilhaços. Tathagata voltou reclamando “alguém vai ter que me ajudar com essas farpas” e olhou pra mim “me virei pra defender o rosto e os estilhaços acabaram acertando minha bunda, seja cuidadosa quando estiver fazendo isso, princesinha”, eu mostrei o dedo do meio pra ele, não por causa da brincadeirinha de mau gosto, mas por me chamar de “princesinha”, daquele jeito que ele sabe que me importuna.
Mamãe disse que eu saí da barriga dela distribuindo chutes na parteira e que ela tentou me treinar na arte da fé e moderação, mas no fim acabei me adequando mais ao estilo do meu tio e isso gera grandes discussões entre os dois. Tathagata costuma dizer “você é a mãe, mas lembre-se que eu sou o sensei da sua princesinha” quando quer insultar ela.
Ender tirou das sombras o esquife feito com a madeira das árvores da Floresta da Madeira-Viva. Não fazia mais de dois minutos que ele o havia escondido no plano das sombras, um lugarzinho medonho que ele é capaz de visitar de vez em quando. Ender é um lorde da penumbra, é assim que ele se autoproclama, e seu poder tem a ver com a escuridão, por mais macabro que isso possa parecer num aliado. Certa vez ele me disse que era discípulo de um tal de Gerad, o primeiro lorde da penumbra que se tem notícia. Ender pode desaparecer na escuridão e viajar pelo plano das sombras, lá, cada passo dado pode ser o equivalente a quilômetros daqui. Ele poderia nos levar muito rápido para o nosso destino, mas, na reunião do templo, mamãe comentou sobre as sombras, espectros e vultos que existem no plano escuro e afirmou que essas criaturas não seriam aliadas. É mais uma das muitas “virtudes” de dona Sophia: ser cuidadosa e não arriscar tanto, assim, resolvemos pegar a estrada de Rivergate até Shantae onde um sujeito chamado Capitão Flint nos encontraria.
Elafir, irmão de Ender, adorou a decisão. Ele costuma dizer “a escuridão não é o caminho, irmão” e esse lema serviu de forma literal para a situação. Elafir e Ender discutem tantas vezes entre si quanto minha mãe e meu tio, mas seus assuntos são mais filosóficos e mais chatos de acompanhar. Elafir é exatamente o oposto de Ender em quase todos os quesitos. Ele estuda o elemento luz e tudo que é capaz de emiti-la, tipo as estrelas. Elafir tem o coração tão bom quanto o de mamãe e às vezes o considero até mais puro. Tathagata me disse “Elafir ainda não conhece todos os limites que o mal pode ultrapassar, ele tem sorte por isso, por ser esse eterno ingênuo”.
Encontramos o tal Capitão Flint e sua pequena tripulação cinco dias depois. Sua caravela voadora, chamada Dragoa Descamada, estava ancorada numa ruína élfica muito parecida com tantas ruínas élficas que nos deparamos viajando por Shantae. Elafir e Ender estavam particularmente tristes, pois outrora Shantae foi um reino élfico magnífico. É difícil acreditar que essas terras devastadas um dia foram “magníficas”. Mamãe me disse que eu não deveria fazer perguntas aos irmãos porque os elfos são muito cheios de sentimentos para com suas terras, “até o Ender?”, eu perguntei e ela assentiu. Deixei minha curiosidade de lado, pois até Tathagata resolveu não incomodar a dupla (e isso era extremamente raro).
Capitão Flint é um velho, do tipo muito velho. Mamãe me disse que ele é um “veterano de guerra” e a Dragoa Descamada era tão velha quanto. Quando notou que eu chamo Lady Sophia de mamãe, Tathagata de tio e Elafir e Ender de irmãos, disse que gostaria muito de ser chamado de vovô, coisa que gostei bastante porque gosto muito de chamar as pessoas pelos seus não-nomes-de-verdade. Cavalgamos o vento na manhã seguinte, Tathagata levou o esquife para um lugar seguro lá dentro, onde mamãe passou a vigiar sem descanso. De noite, ouvimos os berros lamentosos do vovô enquanto dormia, Elafir me explicou que eram “pesadelos provocados pelos traumas da guerra” e frisou o nome “guerra” de modo que me fez saber que não era uma guerra qualquer, mas sim, “A guerra”, aquela ocorrida há muitos anos, no final da era passada, quando eu ainda não tinha nascido.
Vovô continuou tendo pesadelos nas noites posteriores e eles pareciam estar cada vez mais terríveis, tanto que os irmãos resolveram intervir. Tathagata disse que tinha seus próprios traumas e isso já era suficiente. Acontece que Ender possui um conhecimento peculiar sobre pesadelos e Elafir a capacidade de acabar com eles, assim, eles se trancaram no convés com o capitão e só saíram de lá vinte e quatro horas depois com o velho distribuindo simpatia saudável. Os irmãos estavam exaustos.
O capitão ficou bem, mas nas noites posteriores, toda a tripulação passava pelos mesmos aperreios. Até Tathagata pôde presumir o que era, ele resmungou “bruxa!” e cuspiu no chão. Mamãe e os demais têm certa experiência com as megeras. O que tem dentro do esquife foi recuperado das garras das bruxas da Floresta Cinzenta com muito esforço. Mamãe me explicou “as bruxas invadem sonhos e os transforma em pesadelos, isso acontece durante o decorrer de várias noites, até que a mente de seu alvo esteja completamente destruída, então, fica mais fácil elas vencerem uma luta páreo a páreo”.
Ela disse que não podíamos fazer nada, que o que estava no esquife era mais importante e só podíamos rezar e esperar que a tripulação sobrevivesse aos seus próprios medos. Eu assenti, mas me senti entediada e quando estou entediada preciso me divertir com alguma coisa e, de acordo com meu tio, minha principal diversão é desobedecer a mamãe. Ela não merece tanta rebeldia, mas eu também não mereço ser superprotegida. Já me explicaram quem eu sou, o que eu sou, então, porque deveria ter medo de uma mera presença nos sonhos?
De noite, escalei a lateral da Dragoa Escamada numa cena que se minha mãe visse enfartaria e alcancei a câmara de ferramentas, um lugar abaixo da caravela que eu tinha visto enquanto a embarcação ainda estava ancorada. Eu precisava adormecer pela maior quantidade de tempo possível e ganharia alguns minutos ali, caso minha mãe desconfiasse que eu estivesse aprontando.
Lá estava cheio de engrenagens e era muito barulhento, ninguém conseguiria dormir ali. Ninguém normal. Então, me concentrei e encontrei meu mundo. Eu o descobri quando tinha 5 anos. Falei dele para mamãe e ela o chamou de “Éden” e disse que tinha alguma coisa a ver com meus antepassados, também me alertou do quão perigoso é visita-lo, mas eu discordei dela, pois não há lugar mais calmo e contemplativo no mundo do que dentro do meu mundo.
O Éden é um lugar seguro no cume de uma montanha acima das nuvens, protegido do frio intenso vindo do deserto de gelo que o circunda. O lugar é um vale de paredes montanhosas altíssimas onde um jardim verdejante dá lugar à uma majestosa cerejeira de folhas róseas e raízes profundas e meio desenterradas. No alto, a copa da cerejeira oferece sombra fresca, no chão escorre uma fonte de água límpida onde salmões vermelhos e dourados nadam pacificamente.
Naquela visita, entretanto, estava tudo diferente. Não era dia, o que é estranho porque no meu mundo sempre é dia e o sol está sempre radiante. Havia uma névoa espessa que acompanhava a escuridão estrangeira. Sentei-me aos pés da cerejeira. Certa vez, alguns acadêmicos do Museu Vulcânico de Sazancross me disseram “esta árvore representa seu espírito e quanto mais harmonizada estiver com ele, maior e mais forte esta árvore será”. Assim deduzi que meu espírito é muito forte, porque os galhos e raízes da cerejeira estão em todo lugar no meu mundo.
Ao invés de encontrar paz, eu a vi, a megera, a bruxa que estava no pesadelo de todos. Ela deu um sorriso de escárnio e deu pra sacar que eu era tudo que ela queria. “Eu sou Rogane”, ela resolveu se apresentar e eu sabia que essa era uma mania muito constante entre os vilões, “meus antepassados e eu já devoramos muitas criaturinhas como você”. O que ela queria dizer com isso? “...criaturinhas como você”, ela se referia ao fato de eu ser humana ou às pessoas que também têm a capacidade de encontrar o Éden? Dessas últimas, não conheço muitas.
Rogane era escabrosa e ela fazia questão de parecer assim. Ela tinha o rosto e o corpo de uma mulher muito bonita e movimentos delicados que se contrastavam com seu jeito de agir, era selvagem e ao mesmo tempo cálida, o que me atraía muito, pois eu gosto de meninas. Em compensação seu cabelo estava sujo e desgrenhado, coberto de lama e sangue ressecado e uma tintura negra que parecia ser feita das cinzas de um corpo carbonizado cobriam-lhe os olhos, o pescoço e descia pelo corpo até as virilhas.
Ela ficou de cócoras e mijou aos borbotões na água. Eu sabia que era assim que as megeras rogavam suas maldições num lugar. Suas unhas eram grandes e começavam a virar espirais. Ela desapareceu e reapareceu poucos centímetros diante de mim e enfiou a ponta de sua unha negra na minha testa sorrindo. Um filete de sangue despencou escorrendo pelo meu nariz até tocar meus lábios. Senti um peso sobrenatural no meu peito e minha vista começou a escurecer, então, meu corpo passou a não mais reconhecer a gravidade e flutuei, me sentindo como fumaça sendo dissipada por um sopro repentino.
Então comecei minha “magia”. Uma das folhas despencou da cerejeira e foi levada por um vento que até então era inexistente. Desejei que Rogane sofresse e meu mundo começou a realizar isso. Olhei para baixo, tomando controle da levitação, eu estava tão no alto que a megera precisava esticar seu pescoço para me ver e enquanto sua escuridão se dissipava e a minha claridade aparecia, as raízes da cerejeira serpenteavam por suas costas. Começou torcendo um dos braços, ouvi o barulho dos ossos arrebentando, então arremessou Rogane contra o chão, na poça de água formada pela sua urina, então esfregou seu rosto ali.
Por um segundo a megera pensou ter se livrado da tortura. Correu e tropeçou, quebrou o nariz e fez sangrar filetes de sangue na água limpa, então, sentiu a pele rasgar, pois as raízes da cerejeira se enrolaram na sua perna e agora a torcia, torcia até que o som dos músculos se rompendo soassem tão alto quanto o grito de agonia da vítima. Logo apareceram as magdalenas, as borboletas sombrias cujas asas inferiores eram tão longas e finas quanto um par de agulhas. Toda vez que sangue era derramado no meu mundo, elas apareciam feito sanguessugas e tornavam tudo mais distorcidamente belo. Elas saíam da boca, dos ouvidos e dos ferimentos da vítima como um enxame de vermes.
Uma segunda folha caiu da cerejeira e eu despenquei do céu claro como se fosse capaz de andar em cima do vento. Estava disposta a tirar a vida da megera. Agora o sorriso sádico que antes estampava em seu rosto, estava no meu.
Eu desisti da ideia porque tinha planos melhores. Agarrei a cabeça dela com as duas mãos e a encarei. Duas folhas de cerejeira caíram e foram levadas pelo vento. Eu decorei o rosto e o nome de Rogane, então despertei. Ou melhor, me despertaram!
Eu havia travado a porta da câmara de engrenagens, mas Tathagata a havia arrebentado com a força de um punho. Ele gritava mais alto que o barulho dos motores “acorda! Acorda menina! Que merda você tem na cabeça, hein?”. Me agarrou pelo braço e levou para o convés superior onde fui recebida pelo olhar rígido de mamãe.
Ela se apiedou rapidamente, correu ao meu alcance e limpou um filete de sangue que saía tímido de meu nariz e eu nem havia sentido ele ali. A bronca ficaria para depois e eu tive uma das boas, porém, nenhum dos tripulantes da Dragoa Descamada voltou a ter pesadelos durante a viagem.
***
Assim que acordei fui ao convés inferior da Dragoa Escamada. Queria ficar com Tathagata porque eu sabia que todos ainda tinham muita coisa pra me falar na cara e ele seria o mais direto e rápido. Ele falou “você é uma menina burra, Ofélia, pelo amor dos deuses secos e molhados, são três gerações de ofélias fazendo burrice! Prefiro me revirar no estômago de Leviathan” e pôs um ponto final no assunto. Ele bebia. Estava satisfeito com o convés inferior da Dragoa Escamada porque ele muito se assemelhava à uma taverna. Lá tinha um balcão, várias mesas e cadeiras, mas também muitas redes de descanso armadas em colunas de madeira, caixotes e rum, tudo que era comum encontrar no convés inferior de um navio em alto mar.
Tathagata é o elfo do mar mais alto e robusto que já vi. Às vezes me esqueço que ele pertence à uma raça tão exótica... na verdade, ele é bem diferente de seu povo, começando por sua massa corporal. Ender, certa vez, me disse “ele certamente tem as escamas azuis dos elfos do mar, nadadeiras iguais às de um elfo do mar, uma película gelatinosa que envolve seu globo ocular como a dos elfos do mar, porém, biologicamente, nenhum elfo do mar poderia ficar daquele tamanho”. Tathagata também tinha um par de tentáculos azulados que se desenrolavam da articulação da mandíbula e lhe dava a aparência de um elfo do mar muito robusto e barbado. Esses tentáculos são raros na raça, mas existem.
“Eu sou metade watalla”, é a resposta dele quando questionam sobre seu tamanho. Eu conversei bastante com o tio para saber que os watalla foram seres pré-históricos gigantescos, versões bem maiores que os animais que existem atualmente. “Eles estão por aí esperando ser desafiados, derrotados e comidos, e é por isso que eu ando com você, princesinha, porque você sabe fazer um ótimo guisado”, e é verdade, eu e a cozinha somos íntimas desde que me entendo por gente. É um dom.
Eu sabia, porém, que Tathagata além de ser um watalla e comer outros watalla também vestia watalla. “Eu fiz algumas escolhas medonhas na minha vida, mas não me arrependo, escute aqui, princesinha, nunca se arrependa das merdas que você faz na vida” foi o que ele me respondeu quando perguntei sobre seu braço esquerdo, o braço cujo algumas escamas crescem negras e desiguais, feito pele de enguia.
Dizem que elfos do mar não conseguem derramar lágrimas, mas isso é mentira, porque já vi o meu tio chorar. Não era um choro de dor, nem de lamentação, era um choro de “sentir falta”, pois a palavra saudade não existe na língua dos elfos do mar. Mamãe disse que Tathagata sente falta do seu lar e que os elfos do mar só conseguem chorar devido a isso. Dá pra entender que ele tem assuntos inacabados em Absynia, o reino submerso, mas ele acha besteira falar sobre isso. Pensando bem, agora faz sentido o porquê de Tathagata ter respeitado a angústia dos irmãos elfos em relação à Shantae.
***
Há um convés abaixo do inferior, chamam de depósito e lá tem pouco espaço, mas é justamente onde Elafir e Ender folheiam seus livros à luz de um lampião todos os dias. Os irmãos elfos, gêmeos, se juntaram ao grupo recentemente. Eles tinham uma missão e ela havia sido dada pela Inquisição Élfica, entretanto, caso ainda não saiba, essa ordem não existe mais, portanto, agora eles são os dois seres mais aleatórios que alguém pode conhecer.
Elafir da luz, Ender da escuridão. Uma brincadeira do destino. Ambos são prodígios, pois, para o padrão dos elfos, eles são muito jovens. Os dois são tão eficazes que a própria Inquisição Élfica havia confiado uma missão honrosa para ambos e a dupla tinha até um executor imperial asuran para defendê-los – até que este precisou retornar para sua terra natal por motivos maiores que a missão pessoal e desgarrada que se tornou a dos irmãos.
Me aproximei dos dois e quase me arrependi. Estavam discutindo o de sempre, sobre o novo deus da magia. Até onde pude entender, Elafir era do tipo contra e Ender do tipo a favor. “Não sei como um arcano chegou a esses limites, mas, de fato, o que Aensell conseguiu fazer foi usurpar o trono do deus da magia, literalmente controlando sua vontade através de magias provavelmente planares”, deduziu Elafir, mas Ender tinha outra opinião, ele disse “porque suas ideias sempre incluem um mal disputando contra um bem? Está claro pra mim: um artefato se torna mais poderoso nas mãos de um arcano. Vejo a ascensão de Aensell como um tipo de aliança entre os deuses da magia”.
Eles nunca chegariam a um veredito através daquelas discussões, por isso decidiram se tornar fortes o suficiente para surpreender Aensell, o novo deus da magia, e serem chamados para participar dos Sete. Os Sete Arcanos são um grupo de magos poderosos escolhidos à dedo pelo deus da magia afim de realizar missões obscuras, a maioria em outros planos. Era tudo o que eles sabiam, mas pretendiam entender mais e isso só o tempo e a experiência iriam trazer.
Quando eles souberam da minha história resolveram ficar e passaram a nos seguir, cada um guiado pelo seu próprio motivo. Elafir decidiu que era uma tarefa grandiosa e muito importante me proteger e estar perto do que eu representava, Ender, entretanto, sabia que os olhos de Aensell estariam muito vigilantes a qualquer ocorrido com o grupo que eu participava.
***
Mamãe posicionou suas mãos santas em mim e ficou em silêncio por um longo e tenso minuto. Estava procurando vestígios de maldade em mim, apesar de eu ter lhe falado que estava tudo bem. Ela me passou um sermão, ela literalmente rezou uma missa só pra mim e eu assenti com tudo, porque sabia que tinha de ser assim ou o sermão iria durar mais algumas horas. Depois ela me abraçou e exigiu que eu tomasse cuidado.
Qualquer mãe que se preze tem uma ligação muito forte de proteção com o filho, mas no caso da minha, essa ligação é ainda mais forte e fervorosa. Eu não tenho pai, minha mãe disse que a semente que um dia eu fui havia sido gerada milagrosamente em seu ventre pela bênção de Phoebe, a deusa misericordiosa que é representada por uma belíssima ave em chamas e cuja minha mãe é devota. Phoebe é a única coisa que mamãe não questiona na vida, por isso, eu consegui vir para esta jornada, sob a sugestão da fênix e apesar de não saber qual a minha parte nisso tudo.
Mamãe foi bem direta comigo quando saímos de Sazancross, das paredes seguras do templo vulcânico de Phoebe, ela disse “não sei quais os planos de Mara Aruat (esse é outro nome para a deusa Phoebe, mas normalmente só é falado nas terras de Sazancross e pelos nativos de lá), mas não cabe à mim questioná-la, você entretanto, mocinha, não sairá de perto da minha proteção e quando eu me ausentar, fique perto do tio Tathagata e, caso eu e o tio nos ausentemos, fique perto de Elafir”. Ela não comentou nada sobre ficar perto de Ender.
1 Comentários
Ei mah, quase choro. Sdds do Tathagata ❤️🥲 Bgd pelo conto foi de encher a mente e o coração.
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