Os galhos arranharam as
bochechas de Halig quando ele atravessou a moita. As plantas resistiram aos
teimosos golpes de sua espada de madeira. Seus amigos haviam passado pelo mesmo
lugar sem muito estrago, mas Halig é um garoto corpulento que os deuses
abençoaram com o dom da força – os deuses ou as nutritivas tortas feitas das maçãs
de Cadic que ele comia todas as manhãs.
− A tia Diana disse que
não podemos nos afastar tanto assim no bosque, gente – ele reclamou – Gente?
Três outras crianças
esperavam por ele do outro lado, perplexos, observando a formação rochosa que
se estendia a frente.
− Esses montes juntos
formam um cÃrculo quase perfeito. Foi o que li em um dos livros da biblioteca élfica
– comentou uma das quatro crianças, analisando interessado o caminho sinuoso e
estreito cercado pelos altos morros.
− Então, finalmente
chegamos, hein? – concluiu o mais velho e alto dos quatro, um magrela curvado
que parece sempre estar com um sorriso debochado no rosto.
− E-e-esperem! Eu conheço
esse lugar − adiantou-se Halig, ainda se livrando de um punhado de vinhas que
haviam enroscado em seus pés – é o Túmulo de Thalladoran, é um lugar proibido
por decreto. Não devÃamos estar aqui! É perigoso... e proibido.
− Não se preocupe,
Halig. Nada de ruim vai acontecer com a gente hoje – respondeu o magrela.
− E como você sabe disso?
− Eu joguei a moeda.
Halig guardou a espada
de madeira na cinta que ele chamava de bainha e olhou repreensivamente para o
amigo:
− Derek, você sabe que não pode ficar brincando com
a moeda. Lembra do que aconteceu da última vez? Sabe o quão difÃcil foi pra
távola aprisionar aquela bruxa dentro de Thalladoran?
− Porque você tem sempre que questionar tudo, Halig?
Você poderia ser mais como a Violet.
Violet era a garotinha que andava com os quatro. É a
menor deles e também a mais assustada. Apesar disso ela pouco abria a boca e
muito menos questionava qualquer coisa. Na verdade, sempre agia de um jeito
mórbido e distante. Se Violet estava ali, a causa era Laelsen, o mais astuto
dos quatro, ele é um humano que foi criado pelos elfos e também o maior responsável
por todos estarem ali, na entrada do Túmulo de Thalladoran.
Derek não perdeu tempo e foi recolher algumas pedras na
encosta da formação rochosa – pedras eram sua “arma” favorita – Violet se
encantou com algumas flores que nasciam no mesmo lugar, enquanto Halig
caminhava até próximo de Laelsen, que estava maravilhado com o lugar:
− Sabe a Violet, Lael? –
começou Halig, em tom de diplomacia – Não deverÃamos andar com ela. O tio
Cliver disse para não confiar nas pessoas do Hospitalário. Ele disse que ela foi
concebida em resposta à morte de muitas outras pessoas, numa época em que Cadic
estava enfrentando a Mortalha... e-e-eu também não sinto uma energia boa quando
estou perto dela. O lÃder ancião de lá tem planos pra ela.
Laelsen, inquestionavelmente
o lÃder por mera presença, esboçou um sorriso tranquilo, desviou a atenção para
o amigo e respondeu tocando-lhe nos ombros:
− Como pode dizer isso,
Hal? Veja a tamanha inocência que Violet carrega. Ela não é um perigo para
nenhum de nós e nunca será. Eu posso te dizer que o melhor para ela é estar
conosco e o melhor para nós é que ela esteja aqui...
Halig não conseguia entender, mas, desde que conhecera o
amigo sempre notara que suas palavras eram cheias de certeza e segurança. O
garotinho robusto, que havia sido instruÃdo que todo bom guerreiro deveria viver para
defender algo, levou o ensinamento ao pé da letra e, por alguma razão, decidira
que a sabedoria de Laelsen deveria ser preservada, apenas baixou a cabeça assentindo
tudo. Halig acredita que pode proteger Laelsen e pouco importa se o amigo é mais velho e experiente que ele.
− Eu não consigo
desconfiar de alguém que transformou os arredores daquele Hospitalário em um
verdadeiro jardim de rosas – continuou Laelsen.
− Mas-mas, a senhora, mulher
do ex prÃncipe de Azran, Lorde Alberich, também criou um lindo jardim ao redor do castelo e as
histórias que me contam dela são escabrosas. Qualquer um que tente entrar no
jardim é devorado vivo pelos espinhos das roseiras...
− Ah, aquilo lá existe
porque tem de existir. A gente só não pode cutucar lá agora.
Como dito, Ã s vezes Laelsen dizia coisas com tanta
segurança que causava frio na espinha de Halig. O jovem da espada de madeira
preferia chamar esses dizeres do amigo de “sabedoria élfica” e quem sabe ele
não esteja tão distante de estar certo.
Munido com uma porção de boas pedras, Derek voltou para o
grupo limpando um pouco de suor na testa – e deixando um rastro de poeira no
lugar – e perguntou:
− Então, vamos entrar
de uma vez ou o quê?
Laelsen apenas assentiu
e começou a andar na direção do amigo. Não havia temor em seu rosto, Halig se
surpreendia com isso. Não havia medo no rosto de Derek também, mas Halig
deduzia que era porque o magrela era metade louco. Sem qualquer ordem, Violet,
aos tropeços, seguiu os demais para um caminho estreito que se distanciava cada
vez mais da luz do sol, em direção ao proibido Túmulo de Thalladoran.
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