Black and Blue



Um estrondo se espalhou pela caverna quando ambas as lâminas se chocaram uma sobre a outra. O drow resistia à pressão violenta que a inquisidora estava a fazer contra o corpo dele com as suas lâminas. Enquanto ambos ficavam face a face, um podia ver a expressão do outro. O semblante doentio e risonho do elfo negro não havia se modificado, sua excitação com a raiva implacável de Sapphire era jocosa e fazia seus olhos brilharem em êxtase. Enquanto a face da mulher permanecia incrustada de cólera tão profunda quanto as áreas abissais do oceano. Os olhos que tinha uma coloração cinza constantemente claros e impassíveis e herança do pai estavam escurecidos como uma tormenta inclemente. Algumas veias do pescoço estavam saltadas e com uma aparência esquisita por conta do veneno que ainda circulava em seu corpo. E os dentes cercados e a mostra como as presas de uma besta indomável.

- Minha rara pedra preciosa…. Você é um prêmio maior do que eu poderia imaginar. Hahahahaha! - Os cabelos brancos caíam sobre o rosto negro, criando um contraste que escondia boa parte da face do drow.

A azulada continuava sem emitir um som sequer. Apenas mantinha sua posição enquanto as lâminas de ambos mediam forças para ver quem sobrepujaria quem. Sem pensar duas vezes, o elfo negro empurrou sua adversária, fazendo-a recuar alguns passos para trás. O que lhe dava vantagem no início do combate, porém ele preferia esperar que a ira a traísse. Lar’kull contava com um erro em meio aquele momento insano de Sapphire para contra-atacar e poder enfim oferecer seu sacrifício a sua senhora.

Novamente a elfa ia contra o seu adversário. Agora a luta era engajada e as lâminas de ambos cruzando o ar e chocando-se umas com as outras. Uma dança feroz e intensa tomou conta da caverna. Mesmo ainda debilitada pelo veneno, a elfa ainda conseguia mover-se de modo que seus ataques furiosos ficassem ao nível das defesas hábeis e fluidas do elfo negro.

[...]

Este embate focado proporcionou uma oportunidade perfeita para que o guerreiro estranho pudesse se aproximar da outra refém, a fim de ver se estava em condições de sair viva dali. O estado de Aefendit não era dos melhores, porém ainda vivia e ao sentir o toque leve do exótico homem ela despertou. Preparou-se para atacá-lo, porém ele prontamente lhe fez um sinal para que não o fizesse, estava com uma das espadas em punho e conseguiu ajudar para que ela ficasse de pé.

-Quem é você? O que… Sapphire… - ela ainda estava com a mente embaralhada, voltada  para a luta que acontecia mais ao fundo da caverna, próximo à fogueira. - Ela está viva! Graças ao yeshuas! – A voz dela era de alívio por ainda ver que a amiga estava bem o suficiente até mesmo para batalhar contra quem poderia ter sido seu algoz.

-Não se preocupe com ela ou com apresentações agora. Você está em condições de sair daqui? - o homem falava com certa preocupação, porém sua voz se mantinha calma, retirando uma tira longa de suas vestes e envolvendo o ferimento de Aefendit para que o sangue pudesse coagular.

- Estou em condições de lutar. Não a deixarei sozinha aqui. – Falava com toda determinação que o momento lhe permitia, fazendo uma expressão de dor ao sentir o toque, por mais delicado e sutil que fosse, do pano tocando sua carne exposta.

Não demorou para que os companheiros de Lar’kull percebessem que a distração não passava disso. Destruíram o acampamento atrás de algum rastro até que tiveram esta constatação. Estavam voltando quando viram a cena. Uma briga frenética entre seu líder e a elfa de cabelos azuis. A outra refém estava liberta e na companhia de um humano empunhando uma espada esquisita, enquanto já colocava a mão no cabo da outra, retirando apenas poucos centímetros da espada, enquanto já notava a presença dos dois capangas.  

- Parece que sua disposição para lutar será necessária aqui, minha senhora! - Ficava em guarda o guerreiro, preparado para combater seus inimigos, enquanto o seu verdadeiro objetivo estava nas garras de uma inquisidora furiosa.

- Lhe darei cobertura, estranho! - Se era alguém disposto a lutar contra o adversário, Aefendit não teria ressalvas. Toda ajuda seria mais que bem-vinda naquele momento de extremo perigo.

Enquanto o guerreiro preparava-se para pelejar contra os dois drows, a elfa morena retesava a linha de seu arco. Ambos os drows investiam contra o guerreiro, procurando flanquear para que ele não tivesse escapatória. O homem do oriente esperava até o primeiro drow chegasse perto o suficiente para retirar sua espada e logo aplicar um golpe poderoso. A agilidade do primeiro drow foi o que lhe salvou e ainda rendeu um corte de raspão enorme que ia próximo da coxa direita até o ombro esquerdo. Um guincho de dor vinha do combatente machucado, mas este ainda estava bem e mais que preparado para atacar. O outro veio por trás deste, o usando como cobertura para acertar o humano na lateral do corpo, porém uma flecha de Aefendit o fez desviar para o lado para não ser atingido, impedindo o golpe.

Era um aviso de que aquela batalha não seria fácil. Logo ambos os lacaios de Lar’kull começavam a mover- se de maneira sincrônica e se posicionavam para que o guerreiro ficasse entre eles dois. Os golpes deles eram rebatidos pela habilidade do oriental, porém ele não conseguia rebater os golpes de maneira eficaz sem deixar sua guarda aberta para um possível ataque fatal.

Era hora de Aefendit mostrar o porquê de ter sido chamada ali. A primeira flecha veio certeira na coxa direita do drow que já tinha sido atingido. O alvo da dor urrou fazendo ecoar pela caverna. Foi só neste momento que ambos os outros combatentes, Lar'kull e Sapphire perceberam o que estava acontecendo. A expressão de ambos se manteve, porém, o elfo negro de cabelos brancos sorria de forma mais perversa ainda.

- Você?! Estou com muita sorte hoje! Dois sacrifícios para minha senhora.  Ainda hoje me banharei no seu sangue, azurin! - A risada dele era substituída por uma defesa que veio em resposta ao ataque de Saphirre. - Calma, minha preciosa! Você é dona exclusiva da minha atenção…. Enquanto estiver inteira. -

- Deveria se preocupar primeiro com a dama a sua frente. Não sei se ela deixará um pedaço de você para mim! – Em meio ao embate com os outros dois drow, o homem de Azura falava, defendendo os golpes de ambos com uma leveza e maestria nunca vistas antes por Sapphire.

[...]

Já havia se passado algum tempo desde o início daquela luta. Sapphire estava cansada, porém sua raiva ainda a motivava a continuar além de suas forças normalmente. Enquanto isso, Aefendit atirava suas flechas, atrapalhando os movimentos dos drows e cobrindo a retaguarda do espadachim. Esta bloqueava com maestria, porém, ainda estava com dificuldades de achar alguma brecha fatal, no entanto, preparava-se para o momento correto. Quando a oportunidade aparecesse estaria preparado para aproveitar sem piedade dela.

Lar'kull usava de sua habilidade ágil e escorregadia para se livrar dos golpes de Sapphire. A elfa estava sofrendo com o efeito dolorido de seu corpo, porém não parava. Sua espada longa então achou uma passagem certeira para acertar o ombro esquerdo do drow. Vendo seu sangue começar a tingir as roupas e umedecer a região, avançou em direção a inquisidora, chutando-a nas costelas, atingindo o local onde a lâmina envenenada afetará a serva de Carmine. Era seu momento para derrotar de uma vez por todas aquela meretriz de Shantae. Sapphire, por sua vez, recuou a força, sentindo o gosto amargo do sangue em sua boca e a ferida abrir. A dor era excruciante e o sangue começava a escorrer pela região do abdômen. Estava atordoada demais para reagir completamente ao ataque do drow. A lãmina vinha em direção a sua garganta de forma rápida.

Sua única reação foi defender-se usando o próprio braço direito, a lâmina cravando no bracelete de metal que usava, chegando ao braço. Mais sangue escorria, agora lentamente, pelo seu braço. Aquilo lhe trazia à mente a imagem dos pais em sofrimento. Ela berrou em plena fúria e dor. Agora era sua vez de aniquilar aquele bastardo. Sua testa foi de encontro com o nariz dele, quebrando-o e atordoando sem misericórdia seu oponente. Em seguida seus movimentos foram rápidos, precisos e brutais. Era matar ou ser morta e a segunda opção era inadmissível naquele ponto. Avançou contra Lar’kull e as lâminas trabalharam de forma que a maior quase decepou a perna do drow, desestabilizando-o, enquanto a menor era cravada em sua garganta passando pela nuca.

– Quero ver você sorrir agora, MALDITO! - Um empurrão na face com a sola da bota fez sua lâmina se libertar e o corpo dele cair agonizando e espalhando sangue pelo chão. - Achei que esses nojentos sequer sangravam mais... Bom saber que estava errada sobre isso. - 

Ao se virar, num movimento instintivo, percebeu que ali também já tinha se dado fim. Havia um cheiro doce e refrescante floral misturado ao sangue dos outros dois drows que estavam mutilados e com algumas flechas em pontos estratégicos. Aefendit tinha uma mira impecável e caprichosa.

- Aefendit... Como vamos achar minha irmã agora? Como vamos encontrar... Ametista? – Ela olhava para a amiga em seu estado deplorável. Estava se segurando para não desabar, mas os sangramentos estavam consumindo suas forças. Estava quase para perder a consciência quando o estrangeiro a segurou pelos braços.

- O que você falou sobre a minha rouxinol? – Ele a olhava vendo que estava suando frio com a perca de sangue. Logo a consciência dela se esvaneceu.

O mundo parecia girar enquanto ela foi apanhada por um borrão. Tentava manter-se, mas suas forças estavam por um fio, tinha se entregado completamente na missão de matar o maldito drow. “Rouxinol? Quem é rouxinol? “. Era a última coisa que pensava antes de ser completamente arremessada ao vazio da escuridão.

[...]

O vento mostrava-se as gotículas de água salgada o oceano e levavam a maresia para a costa. Aquela mistura espalhava um cheiro peculiar que apenas as praias tinham. Salgado e úmido o ambiente não era natural para a silhueta que ali se encontrava em estado de meditação. Seu corpo estava coberto por roupas diferentes do que estava habituada a usar antes, tornava-se mais esguia e delgada. 

Os cabelos eram levados pelo vento, como se com eles o Zéfiro desejasse dançar. Seus olhos permaneciam fechados, mas sua mente estava aberta. Ainda resistiria bastante ao estado de imersão, seus pensamentos e lembranças eram mais rápidos e lutavam contra a calmaria que aquele ambiente lhe passava.

- Ei! Você aí! - A voz era de um menino. Estava sujo e suado, talvez tivesse corrido boa parte do caminho até ali. - Mandaram entregar isto para você. - Ele esticava um documento. Arfando e limpando com as costas da mão vazia a testa que brilhava com o suor.

- Para mim? Tem certeza? - Os olhos antes fechados estava olhando agora para o objeto da entrega. Desconfiada como sempre.

- Você bate com a descrição que me deram. E bem.... Não é como achar um peixe no cardume. - O garoto sorria, ainda tentando ser gentil, mas parecia apressado. 

- Está bem! - Ela pegava o documento. O garoto ainda sorria com a mão esticada. 

- Não tenho moedas aqui! Me procure na vila. Como você disse.... Não é como procurar um peixe no cardume. - Ela abria o documento. Despachando o menino. Visualizando que se tratava de uma carta. Lia com atenção. Então dobrava a carta e colocava entre as vestimentas, guardando-a. - Távola de Cadic... O que vocês aprontaram? - Levantava-se, observando o local novamente e fazendo uma reverência. Rumando determinada para a vila. 

FIM


Postar um comentário

0 Comentários

Close Menu