Este é um trecho da apresentação formal das Sombras de Citadel ao reino do príncipe Aisenn:
Narra o príncipe dos desalmados...
Estas são as derradeiras sombras que, por capricho e demasiado tempo ansiei afogar no antro de toda carnificina. Antes heróis, agora testemunho pleno da vitória da fé terrena sobre o maculado, campeões de um passado de ilusória vitória humana, agora arsenal inesperado na luta que anteviu o fim da era, dignos cavaleiros da morte prontos a serem liderados pela minha vontade.
Eis que as quatro figuras ajoelham-se agora diante do príncipe e seu trono de carne, condicionadas, rostos voltados ao chão, olhos fechados em submissão.
Ragnar, alvo do exílio e da descrença anã. Uma vez bebeu do sangue de um príncipe de sua raça e, como se não bastasse, mastigou-lhe a alma, tornando-se errôneo portador da chama divina. Agora a extinta habilidade foi compensada pela incinerante magia do fogo fátuo, negro como a morte, rápido como um glutão esfomeado.
Ergueu-se o anão de barba branca e armadura negra feita de cravos, forjados como uma dezena de presas a saltar do aço, olho direito esbranquiçado pelo ferimento que um dia partiu-lhe a carne e rachou-lhe o crânio. A barba ancorada em seu rosto quadrangular, fiapos atrozes de uma criatura selvagem, duros pelo sangue ressequido, rústico molde de guerreiro abençoado pela invulnerabilidade. Seu machado reagindo à escuridão, envolvido por uma garra de névoa voraz.
Aeranir, alvo do exílio e da vergonha élfica. Suas mãos afundaram-se nas tripas de inúmeras vítimas, sem beleza apenas pecado e honra, propositalmente incógnito para seus irmãos elfos. Suas lâminas acertam como o vento e sua sombra se move como uma pantera a saltar sem rodeios para a garganta inimiga.
Ergueu-se agora o lépido e esguio elfo com a máscara metálica e cinzenta a cobrir-lhe o rosto, seus olhos aguçados, por trás da ocultação, eram vermelhos-gotejante. Sua vestimenta de pantera deslocadora atada ao torso, como se costurada à pele e uma sombra inquieta a rosnar caçadora obedecendo sua presença. Girou o corpo e pescoço de forma descomunal enquanto seus membros flexíveis, como os de um contorcionista, giravam a mortal espada de duas lâminas num vórtice de ofensiva infalível.
Azanthe, alvo do exílio e da desonra beligerante. Suas flechas cravaram certeiras e fulminantes nas cabeças de seus inimigos e devoraram o coração dos pecadores e quantas centenas e mais centenas mil vidas foram tiradas para encerrar a mágoa de seu pai. Seu arco, presente da criatividade da rainha das fadas, invoca as quatro estações como o rogar da maldição sobre um inimigo.
Adiante levantava-se ostentoso o arqueiro que, em face pálida, mantinha o desânimo emoldurando arroxeado seus olhos opacos, tomados vítimas de espectro, assim, sem mais nem menos, moldado como porcelana aparente frágil, contornado pelas fugidias placas de mithral maculado pelo toque de demônios espavoridos. Fiel, agarrado em suas manoplas, o arco de teixo negro e runas ígneas, enodoado pela mancha conspurcada de infinitas vítimas.
Millo, hipócrita sombra dos traidores. Caçador de acólitos e senhor das fraudes, sacrílego dos aspectos divinos. Possuiu, somente para si, uma cidade, cravada na garganta de uma montanha onde pusera as cabeças de suas vítimas incontáveis por mero vingança.
Por fim, apresentou-se, como uma escuridão que se desenterra de outra, os olhos amarelos tingidos de perversidade, o rosto monstruoso de um rato, dentes incisivos afiados, pelagem de denso negrume, tão esguio e minucioso que pouco se viu de suas lâminas curtas famintas por gargantas.
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